Compreenda apenas uma coisa: tudo aqui é mais real do que
possa imaginar. Podem parecer diversas metáforas escritas, mas todas elas são
reais. Mais do que possa imaginar.
Três longos anos. Três anos de sofrimento. Três anos de
culpa. A partida para um mundo onde eu poderia esquecer os meus pesadelos reais
foi relativamente muito fácil. O abraço terno que eu recebi na chegada me fez
ficar, e ficar, e ficar... Quase que para sempre. No fundo, eu já havia perdido
a esperança. Eu já havia me entregado, e sabia (ou pelo menos imaginava), que o
futuro real não mais existiria. Três longos anos sem dormir direito. À espera
do primeiro raio de Sol para que minha alma pudesse repousar, sem ter tanto
medo de que os demônios invadissem a minha mente e estuprassem meu corpo. Sem
nunca mais conseguir dormir à noite, por medo. Dias sem dormir, uma eterna
sonâmbula, uma amante que nunca foi amada. Três anos de sofrimento, e vocês
nunca poderão imaginar as noites que passei acordada chorando copiosamente por
vocês e para vocês. Toda a dor dilacerante na alma, desde o dia em que não
estava lá, o dia da traição, em que estava vendo o motivo da minha vida ir
embora em um hospital. Eu me lembro como se fosse hoje, de deitar no sofá, com
uma blusa branca de tricô e pensar "O que será da minha vida agora?",
mas a minha escolha foi fugir da realidade e me entregar a outra vida, e fui
recebida de braços abertos. Dias sem nunca mais dormir, ouvindo sussurros de
demônios que me perseguiam, demônios estes que o Enganador de Tolos me mostrou
com sabedoria, plantou em minha mente. Vocês nunca poderão imaginar a dor pela
qual eu passei. Todas as lágrimas que derramei e toda a vida que se esvaiu de
mim, foi simplesmente perdida. Vocês todos nunca estiveram lá realmente para
olhar, que no fundo eu não passava de uma menina com muito medo, sozinha, e
tola. Uma princesa que sempre esteve presa ao seu castelo de desejos, inútil,
fútil, egoísta. Uma maldita medrosa, uma amaldiçoada. Outro rosto, mas com a
mesma personalidade. A mesma essência, a mesma garotinha, fingindo ou tentando
apenas ser alguém melhor. Os desejos de morte. Os desejos de encontro. Nunca
saberão nada disso. A vontade de morrer quando eu descobri toda a verdade. O
meu coração partido, quando me cortaram em pedaços.
Eu enlouqueci. Eu me sentia cada vez mais perto Dela, e me
lembro da primeira vez que ouvi sua doce e suave voz. É algo belo, é trágico, é
encantador. Ela morre e nasce comigo durante todos os dias, e hoje eu acredito
que isso irá perdurar até o fim dos meus dias. Porque hoje eu entendo que ela
simplesmente sou eu, e ponto final. Minha cabeça virou, meus sentimentos
passaram a ser tão confusos de uma maneira que eu nunca mais consegui me
enxergar novamente. Eu precisei de ajuda, mas eu nunca a tive. Eu fiquei louca,
neurótica, medrosa, impulsiva, descontrolada... Eu bati nas pessoas, eu quebrei
objetos. Eu enlouqueci e a minha alma simplesmente se perdeu, se entregou. Mas
eu aceitei a minha loucura, minha doce loucura. Saber lidar com coisas que
nunca podem te abandonar às vezes pode ser um dom ou uma maldição.
A culpa. Depois de tudo, depois de todas as lutas para que
tudo fosse recuperado novamente, em vão, o que me restou foi apenas a solidão
(aquela minha companheira inseparável) e a culpa. A culpa que eu carreguei nos
três anos e nos próximos três, uma culpa que me perseguia todas as noites,
desde a hora que eu colocava a cabeça no travesseiro, até o momento que
despertava. Uma culpa que me levou ao fundo do poço. Um sentimento de ser
maldita, de ser uma prostituta de Satã, um ser humano que só merecia a morte.
Uma culpa que foi apenas superada com o tempo. Pois com o tempo, eu
simplesmente esqueci. No meu Palácio de Memórias, restaram apenas algumas
memórias muito confusas, e a culpa que matou parte da minha alma, desapareceu.
Eu amei. Meu amor, meu querido, doce amor. Nunca duvide, por
favor, do quanto eu amei. Amei de uma maneira obsessiva, estranha, doentia,
errada. Mas eu amei. Eu juro que amei. Amei a maneira que me ensinaram a amar,
simplesmente. Nunca duvide, eu errei muito (vestígios de culpa até hoje), mas
eu verdadeiramente lhe amei.
-
Após inúmeras noites em claro, após o meu escapismo final
para me reencontrar comigo mesma e com Ela, eu conseguir acordar. Minha mente
deixou de questionar, pois eu não fazia mais questão de compreender. A minha
culpa transformou-se em algo compreensível, pois toda a dor, todo o sentimento
de culpa, e todo o amor, foram compartilhados por todos os presentes.
-
Acredite quando eu lhe disser que esse é um desabafo por
amor. E eu agradeço. Hoje eu agradeço por tudo que passei. Por esses três anos
insanos de dor, de conflitos e loucura. E eu amei cada dia que passei e cada
facada no meu peito. Hoje, eu apenas agradeço por ter me tornado alguém um
pouco melhor depois disso tudo. Assim como as cicatrizes tem o poder de nos lembrar
de que o passado foi real, o tempo também passa. Mas a nostalgia, ela sempre
irá permanecer. Pois as lembranças guardadas no Palácio de Memórias permanecem,
e o amor transformou-se em carinho e uma sincera gratidão por tudo que me fez transcender
de alguma maneira. Muito obrigada, por toda a dor que eu passei. Hoje eu sei
que nada daquilo foi em vão. Hoje, eu diria sim, se tivesse que viver tudo
aquilo novamente, pois eu sei que sobreviveria, e passaria a ser alguém melhor.
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